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terça-feira, 23 de março de 2010

vozesnet.m4v




http://www.youtube.com/watch?v=y4obMiWCw5w


arte copy´ndpaste

sábado, 20 de março de 2010

um manicômio privado que se chama família



o problema não é a loucura
é a estupidez
o problema é que não há loucura
onde não houve
maldade


o tolo aposta suas chances na loteria
do acaso
o sábio toma do azar
as oportunidades


o louco pode fazer qualquer coisa
o idiota só
uma


de vez em quando é bom mudar
de idiotia
porque as paixões mudam
mas a paixão
nunca

.
____________________________________
Sem título, Cleusa de Souza, técnica mista, 2005.

quinta-feira, 11 de março de 2010



O desejo
do sonho é poder
acordar
quem dorme na vida

Como aconteceu recentemente
abriram
todas as minhas portas
no embalo
dos infinitos problemas da nossa rede
de conexão

O mais perturbador
(não sou um tipo intolerante
às quebras
de normas)
foi a silenciosa mas completa
disjunção
entre as situações seus tempos e seus
ruídos

Estas
as verdadeiras invasões bárbaras
indivíduos
que por falta de pausas em seu cotidiano
delirante
não escandem o murmúrio
dos fantasmas
as preces dos moribundos os lapsos
o vazio

Vieram
dizer a um cara
que a enchente tinha levado o carro dele
respondeu
impossível tenho aqui no bolso
a chave

________________________________________
Aquarela de Jotacah Rolando, "Madona"

sábado, 6 de março de 2010

pequenos ― e constantes ― delitos


Samba?
poesia não cede
nem cedo
de
pura
eu
muitas vezes via
a ínvia
impossível vida
e você a me dizer
apura
no plantio da sensimilla
o chulé verbal
dos vãos trocadilhos
e nessas o poeta
submerso em bruxarias
sua
para pagar o condomínio
sua luz bruxuleia
incerta
seu andar de sátrapa
e os carnês todos atrasados
ainda assim
poeta que é poeta não abandona
existe de pura
teimosia
homero sexual
humilhado
pela nossa cegueira
sem nada
ou ninguém que o valha
o velho lear
insiste
enche o saco de meio mundo
em êxtase
diz a todo momento que poesia é acidente
uma forma rara
do lugar
comum
----------------------------
"São Sebastião, quiçá Narciso" de Jotacá Rolando



o poeta e xamam Roberto Piva-Shiva recebe pelas consultas

banco Itaú
agencia 0036
conta corrente 20592-0
cpf 565.802.828-00

http://www.youtube.com/watch?v=bWsV9AIZCqA

sexta-feira, 5 de março de 2010

quinta-feira, 4 de março de 2010

o espólio da senhora Maeda (parte 1)


A SITUAÇÃO: piano-bar de um tradicional clube de São Paulo, capital, onde dois amigos degustam o terceiro bourbon da tarde, enquanto a quarta cerveja Guiness espera no balde com gelo. Eles performam um antigo hábito no clube que freqüentam desde que nasceram, o “esquenta” vespertino que precede a parceirada de bridge à noite no salão de jogos. Têm a mesma idade, 53 anos, e um deles está prestes a fazer uma revelação.

OS AMIGOS:
Rafael é um financista, investidor com interesses nos empreendimentos de alta tecnologia; ele mesmo tendo sido empresário e inventor de um sistema revolucionário de controle de estoques e distribuição no ramo da logística. Ex-obeso mórbido, perdeu 46 kg no último ano e meio após uma cirurgia bariátrica. Nunca se casou, não tem filhos e mora com o irmão mais novo e uma tia.
Pedro está prestes a mergulhar de cabeça no 5º casamento (que na verdade é a retomada do 2º), tem 3 filhos e uma contenda jurídica pela guarda do terceiro filho, fruto do 4º e, até agora, último casamento. Antiquário de profissão, toca a empresa fundada pela mãe, falecida há 4 anos; herdou do pai a paixão pelo antigo-mobilismo e tem a maior coleção de Pumas conversíveis do Brasil.

Há palavras capazes de mudar uma vida. Também se poderia dizer, com mais razão ainda, que há confissões que mudam uma amizade. Assim como a rocha equilibrada no flanco da montanha, a chispa que cai na capoeira seca da floresta, o esporo que vai destruir a colheita da batata, o grão de escrúpulo que impede o homem de ousar, ou o grau de obsessão que faz filósofos ou idiotas, uma pequena causa pode gerar efeitos desproporcionalmente grandes. Talvez seja exagerado afirmar que uma palavra mal colocada pode lançar o mundo na guerra, mas ninguém há de negar que há situações extremamente dependentes em relação às condições iniciais ― e é aí que uma gota vira onda. Rafael e Pedro se conhecem desde antes do que a memória de ambos alcança, a começar por terem nascido em famílias unidas por laços de antiga amizade, com diferença de três meses, na mesma maternidade e pelas mãos do mesmo obstetra. De tudo na vida partilharam: a escola, os companheiros, as esbórnias, os primeiros namoros, a segunda falência, etc.; a única separação que conheceram foi na escolha profissional, quando Rafael se tornou politécnico e Pedro iniciou o curso (que nunca terminou) de História.

A amizade entre ambos, que tomam por um fenômeno natural entre outros, está para ser testada no decorrer de uma conversa banal em função de uma observação absolutamente anódina. Rafael aconselhava Pedro acerca da sua mania de reclamar ostensivamente dos garçons. A piada interna de Rafael quando o amigo pedia um café era dizer-lhe para pedir logo dois, uma vez que o primeiro fatalmente voltaria por estar frio, ou por isto, ou por aquilo, ou apenas pelo puro hábito de rezingar.

― Nunca vi um cara mais fresco do que você. Mas esse workshop do segmento de bares e restaurantes que acabei de fazer me tirou todas as dúvidas: não se pode chatear o atendente que realiza uma tarefa longe do olhar do cliente.

― Que é que você quer? Não posso diminuir meus padrões de qualidade, se você é gourmand, ou ex-gourmand se preferir, e eu sou o gourmet... ― de fato, Pedro sorvia sua cerveja preta como se fosse um licor, ao passo que o outro tinha modos de viking até para encher de ovas de esturjão uma simples torrada.

― Pois então, senhor gourmet, saiba que você é um apreciador contumaz e involuntário do que garçons e maîtres apelidaram de Molho Especial. O nome completo é: Molho Especial Para Clientes Malas; deixe a sua imaginação gastronômica se deliciar com tudo que um funcionário humilhado publicamente pode lhe ofertar em privado: secreção nasal, cuspe, sola de sapato, secreções da acne, suor do peito, da bunda, exsudato de furúnculo...

― Pára, pára... gulp, que nojo! Eu não humilho ninguém, e depois, tem que se aceitar tudo, é? ― Pedro acabava de se arrepender da porção que encomendara há instantes.

Rafael considerava os bolinhos de bacalhau recém chegados com a melancolia de quem sabia que não poderia atacar mais do que dois deles; tinha de se contentar com porções ridículas desde que seu estômago fora reduzido ao tamanho de um porta-moedas e deixara de desembocar no duodeno para fazê-lo mais abaixo no intestino delgado. ― Olha, mandar voltar, pedir mais isto, menos aquilo, apurar o ponto... tudo isso é do jogo, onde você extrapola é no piti, no esporro ostensivo. E aí não tem perdão: Molho Especial na certa. Calculo uma incidência de 97% desse tempero em clientes com o seu perfil estressadinho.

― Rafael Afonso, meu querido, você tem o dom de ser disgusting; afirmo, sem medo de exagerar, que você elevou o grotesco ao nível de uma arte.

― É possível, mas nunca confie no que um homem faz quando ninguém sabe o que ele está fazendo; deixado a si mesmo o ser humano... ― Interrompeu-se, as palavras pareciam entrar em brasa viva nos ouvidos do outro. O silêncio imediato e a mudez subseqüente do amigo produziram nele uma impressão esquisita, como a passagem de um fantasma. Uma conhecida que passeava com uma criança pequena chamou a atenção de ambos e proporcionou a manobra diversionista que Rafael precisava para afastar o hiato constrangedor. Não podia deixar seu parceiro naquele ânimo sorumbático sabendo que o cacife da rodada de bridge, contra recente norma baixada no clube, valeria mil reais. ― Lembra dela?

― Claro que sim, é a Carlinha, sua namorada na 7ª B. Mas... por que você disse isso?...

― Por quê? Ora essa, porque ela me traz boas lembranças...

― Não tô me referindo a ela, Pedro Bó, tô falando daquele negócio do que as pessoas fazem quando ninguém vê!

― Não te parece óbvio? Ninguém é confiável quando não há ninguém vigiando, são os becos escuros da alma, queridão ― Rafael tentou encerrar o assunto com uma espetada certeira numa azeitona, que resvalou teimosamente pela travessa. ― Já sobre a Carlinha tenho uma instrutiva passagem para contar: dez anos faz que a reencontrei na mercearia do Jockey. Ela ainda não tinha essa neta, mas já tinha se separado, ou melhor, o marido já tinha se mudado para a casa da estagiária da empresa... Daí que a encontro, já recuperada do trauma, sarada, siliconada, bronzeada e tal... papo vai, papo vem, marcamos um jantar. Veja, na época em que namoramos... milhentos anos atrás éramos adolescentes, não rolou nada... uns beijinhos e tal e coisa, muito tesão e pouca ação, né? Mas agora a coisa era diferente, dava pra tirar a limpo, resgatar uma dúvida histórica, no gênero “como teria sido se”...

― Entendo: um revival 40 anos e 80 quilos depois. Ao menos no seu caso...

― Lindo, vou desconsiderar a maldade gratuita embutida em suas palavras e pular uma descrição grosseira da maravilhosa noite de amor que tivemos, apesar das dez arrobas que este galã possuía então. Pois fique sabendo que ela me confessou no pós coito que eu estava no topo da lista dos homens que ela sempre quis conhecer bilblicamente, por assim dizer...

― Perva!...

― E aí me animei, falei que queria sair com ela de novo no fim de semana. Mas ela disse que não podia.

― Como assim, recusava a felicidade carnal a recém-Messalina?

― Ao contrário, respondeu-me na maior candura e caradura: “falei que você estava no topo, mas, e o resto da lista?”
― Hahahaha, muito boa! Per bacco, essa é que é a verdadeira busca do tempo perdido, excelente! ― Pedro riu gostosa e sinceramente, mas não podia disfarçar por inteiro que algum assunto continuava a remoer em seu íntimo. ― Rafa, acho que preciso te contar uma coisa... enfim, é um treco que nunca consegui falar com ninguém. Você se lembra de eu ter falado sobre o espólio da senhora Maeda?
(CONTINUA...)

quarta-feira, 3 de março de 2010