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quarta-feira, 7 de julho de 2010

O Judeu, como aquilo que sempre resta

Fenômenos contemporâneos como o revisionismo do Holocausto, a equalização moral de todas as vítimas da Segunda Guerra Mundial(os alemães sofreram nos bombardeios feitos pelos russos e ingleses tanto quanto os judeus exterminados na Shoa), são resultado da lógica Européia de apagamento da história, ou seja, de sua própria memória, na tentativa de unificar-se.

Essa tentativa de tornar-se Um consigo mesmo segue a lógica de um Não-todo tornar-se um Todo fechado sobre si , ou seja, a superação de um antagonismo segundo a lógica de superação da modernidade para a pós-modernidade guiada pela lógica do Império. Desde Kant, Paz Imperial rima com Paz perpétua que por sua vez rima com Clausewitz às avessas na continuação da guerra como política do Estado de exceção permanente . Se raciocinarmos com Jean Claude Milner [Em seu livro: penchants criminels de l'Europe démocratique] de que essa virada histórica é a promessa da superação de um limite imposto pela Lei, ou seja, a promessa de parousia(sonho grego e cristão) de uma jouissance, livre de todos os obstáculos impostos pela tradição, compreenderemos que a matriz ideológica pós-moderna não é mais o cristianismo, mas sim a New Age neo-pagã que pretende superar a diferença sexual com a unificação de um corpo singular,da transposição da morte através da engenharia biotecnológica, da transformação do Hardware em Software, do Humano em pós -humano, em entes virtuais que podem migrar de uma incorporação temporária para outra. Eis as palavras de Milner:



Se a modernidade é definida por uma crença na realização ilimitada dos sonhos, nosso futuro está totalmente delineado. Ele passa pelo antijudaísmo teórico e prático absoluto.Para seguirmos Lacan para além do que ele afirmou de maneira explícita, os fundamentos de uma nova religião são assim postulados: o antijudaísmo será a religião natural da humanidade por vir.

Se o gozo para além da lei é impossível pois seria a própria lei o que engendraria o Desejo e sendo ele mesmo aquilo que gira em torno do objeto a (objeto causa) , não seria o judeu aquele que impede a Europa de constituir-se como tal ?E o judeu sendo aquele "fora-da-lei" dos imperativos do gozo neo-capitalista de sociedades "pós-industriais", aquele que impede que a Europa se integre? E não seria o próprio Estado de Israel a prova de que a Europa continua desejando livrar-se deles, e o apoio que Ela dá a causa palestina não seria a confirmação dessa lógica?

Os interessados na história do anti-semitismo podem recordar que Adolf Eichman e Feivel Polkes,membro da Haganá(organização secreta sionista),encontraram-se em Tel-Aviv em setembro de 1937 para discutir a emigração de judeus para a Palestina, ou seja tanto alemães como sionistas queriam a criação do Estado de Israel, os alemães com o objetivo de expulsá-los da Europa e os sionitas com o objetivo de fazer frente numérica aos árabes.Portanto a Faixa de Gaza representa mais do que um conflito entre árabes e judeus, esse conflito pode ser a base do antagonismo, mas outro antagonismo pode ser lido aqui. Entre a Europa e os Estados Unidos em relação a suas respectivas democracias, ou a disputa dentre quais das duas irá afirmar-se hegemonicamente.

Na democracia dos Estados Unidos, existe a maioria, mas ela não fala(maioria silenciosa) e, quando fala, torna-se uma forma particular de minoria.Nos Estados Unidos, a democracia é entendida como o campo da inter-relação entre agentes múltiplos, nenhum dos quais incorpora o Todo,ou seja, são todos "minoritários"; na Europa, a democracia refere-se, tradicionalmente,à regra do Povo-Uno. Entretanto, Milner tira daí uma conclusão elegante sobre o que acontece hoje: ao contrário dos Estados Unidos, que como sociedade é predominante "não-todo"- em sua economia, sua cultura, sua ideologia-, a Europa tem ido muito além no rumo de constituir-se muito mais como um Todo político ilimitado por meio do processo de unificação européia, no qual a espaço para todos , seja qual for sua origem geográfica ou cultural, inclusive para Chipre e Turquia.
Para designar esse "novo" estado de coisas, Étienne Balibar referiu-se à velha frase de Marx "Es gipt keinnen Staat in Europa-"Não há nenhum Estado na Europa". O antigo espectro do Leviatã, parasitando o Lebenwelt (mundo da vida) da social , totalizando-a de cima para baixo, é cada vez mais desgastado por duas vertentes. De um lado, existem as novas comunidades étnicas emergentes; embora algumas sejam formalmente contituídas como Estados soberanos,elas já não são propriamente Estados na acepção moderna do termo,uma vez que não cortaram o cordão umbilical entre o Estado e a comunidade étnica. (exemplar é o caso da Rússia, onde as máfias funcionam como espécie de estrutura paralela de poder).Por outro lado, existem os múltiplos vínculos transnacionais, desde o capital trans-nacional até os cartéis da máfia e as comunidades interestatais. Há duas razões para essa limitação da soberania estatal cada qual suficientemente marcante, por si só, para justificá-la: o caráter transnacional da crise ecológica e da ameaça nuclear. Essa erosão da autoridade estatal por ambos os lados mostra-se no fato de que, atualmente, o antagonismo político básico é o que ocorre entre a liberal-democracia "cosmopolita" universalista (representando a força que corrói o Estado de baixo para cima) e o "novo"populismo-comunitarista "orgânico"(representando a força que corrói o Estado de baixo para cima).

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